O epíteto de “Laranja Mecânica”, tal como a obra-prima de Stanley Kubrick, é hoje mais catalogável na prateleira dos clássicos do que propriamente numa corrente de modernismo. O presente da seleção holandesa é amargo e de (re)montagem, longe da doce reminiscência das gerações de Cruijff, van Basten ou dos próprios vice-campeões do Mundo de 2010.
Prova maior do momento de convulsão desta Holanda é a ausência do próximo Campeonato do Mundo, que se segue à presença falhada no último Europeu, em França. Dois apuramentos fracassados de forma consecutiva é caso único para os holandeses no século XXI, que desde a viragem do milénio só tinham ficado de fora do Mundial da Coreia do Sul e do Japão, em 2002.
Um contrassenso. Olhar para a atual existência da seleção holandesa é perceber que a realidade é uma espécie de “Scarface”, em contraponto com o passado elegante e marcante que moldou o pensamento futebolístico moderno. É certo que a vitrina dos títulos está longe de ter o brilho de outras nações; a conquista do Europeu de 1988, na Alemanha, solo do histórico rival e vizinho, continua a ser a única, mas nem só de troféus se construiu o mito.
Se Marco van Basten era o máximo pontífice dessa seleção galardoada, recuar aos anos 70 é ir à génese desse mesmo mito, personificado num nome: Johan Cruijff. O «maestro» da versão original da “Laranja Mecânica” esteve perto da glória suprema em 1974, mas seria derrotado na final pela Alemanha (1x2); quatro anos depois, já sem Cruijff, em 1978, a Holanda voltou a tombar no jogo decisivo, diante da Argentina (1x3).
Ficou, contudo, o perfume e o legado que o próprio Cruijff transportou consigo para o banco e para o jogo, sobretudo do FC Barcelona, influenciando significativamente o ADN dos catalães e, com ele, um estilo que ainda hoje é admirado e seguido, especialmente por um dos pupilos do holandês: Pep Guardiola.
Depois dos vice-títulos mundiais na década de 70, a Holanda voltou a estar perto do sonho em 2010, na África do Sul, mas o derradeiro jogo voltaria a ser madrasto e a Espanha sagrar-se-ia campeã do Mundo (1x0). No que toca a Europeus, e à exceção do título de 1988, os holandeses marcaram presença em três meias-finais (1992, 2000 e 2004), falhando sempre a passagem à final.
As histórias das seleções de Portugal e da Holanda escreveram-se algumas vezes em paralelo, quase sempre com final feliz para os lusitanos. Das sete vezes em que foram colocados frente-a-frente em jogos «a doer», a seleção portuguesa perdeu apenas uma vez (1982, por 1x0), contabilizando cinco vitórias e um empate.
Em fases finais de grandes competições foram três os duelos: o primeiro, em 2004, no Europeu português, foi resolvido com golos de Cristiano Ronaldo e Maniche em Alvalade, e nem o autogolo de Jorge Andrade tirou a final a Portugal. Dois anos mais tarde, no Mundial da Alemanha, Maniche voltaria a ser decisivo ao apontar o golo no triunfo luso por 1x0, nos oitavos-de-final, naquela que ficou conhecida como a «Batalha de Nuremberga».
O último duelo oficial entre Portugal e Holanda deu-se em 2012, na Ucrânia, na derradeira jornada da fase de grupos do Europeu. A seleção comandada por Paulo Bento entrava em campo com três pontos e a precisar da vitória para ter garantias de apuramento.
Rafael van der Vaart até adiantou os holandeses no marcador, mas a aura e o talento de Cristiano Ronaldo acabariam por se evidenciar. Resultado: dois golos do capitão e vitória de Portugal por 2x1, estampando novo selo de superioridade portuguesa nos duelos entre as duas nações.
0-3 | ||
Memphis Depay 11' Ryan Babel 32' Virgil Van Dijk 45' |