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História

Vítor Oliveira: O Rei das Subidas

Texto por Ricardo Miguel Gonçalves
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Não é com muita frequência que surge no futebol português uma figura de referência que não tenha estado em nenhum momento associada a algum dos três grandes, como foi o caso de Vítor Oliveira.

O treinador atingiu estatuto de ícone no panorama desportivo nacional, onde será sempre recordado por um legado de feitos e conquistas que muito dificilmente serão igualados. Foram quatro décadas enquanto treinador, um período em que se destacou principalmente pelas impressionantes 11 promoções que garantiu ao leme de equipas na II Divisão.

Fica para a história um legado repleto de conquistas e alegrias, de um nome imortalizado nos prémios entregues mensal e anualmente aos treinadores da Liga Portugal.

Sempre a subir

Nascido em novembro de 1953, o matosinhense teve de esperar 19 anos para dar os primeiros passos no mundo do futebol profissional. Antes de ser um treinador de referência, Vítor Oliveira foi jogador do clube da terra, o Leixões, onde escreveu as primeiras páginas de uma história que ainda passaria por Famalicão, Espinho, SC Braga e Portimonense durante o capítulo em que ocupou o lado de dentro do campo.

No final de uma temporada no Portimonense, Vítor Oliveira foi chamado ao gabinete da direção, onde achou que encontraria uma proposta de renovação de contrato, mas na verdade estava o cargo de treinador à sua espera. Aos 31 anos o médio pendurou as botas, e começou imediatamente a caminhada que o levou até aos holofotes.

Quem sugeriu o nome de Vítor Oliveira ao presidente do emblema de Portimão, que não queria contratar um treinador, foi Manuel José. «Mas ele é o palhaço da equipa», disse o presidente, segundo conta o próprio Manuel José, que por sua vez respondeu: «Pois é, mas quando aquilo aquece quem manda na equipa é ele». O que se seguiu, foi história.

Assumiu imediatamente o comando da equipa de Portimão, onde venceu 13 das suas primeiras 33 partidas e terminou num surpreendente sétimo lugar da primeira divisão do futebol português, com apenas 32 anos. Tinha já antes, nos tempos em que representara o Famalicão, acumulado as funções de jogador com as de treinador durante um curto período, mas esta não deixava de ser a primeira experiência «a sério».

Subida com o União de Leiria, em 1998 @União de Leiria
O primeiro grande feito surgiria poucos anos mais tarde, e foi logo aquele que o acabaria por tornar famoso. Ao serviço do Paços de Ferreira, Vítor Oliveira conseguiu aquela que foi a sua primeira subida ao principal escalão em 1990/91, e logo com o título da então chamada 2ª Divisão de Honra.

«Se me chamam para uma equipa que luta pela permanência, não tenho interesse. Prefiro ir para um escalão inferior e subir», disse, em entrevista ao jornal espanhol El País, resumindo aquela que foi a sua filosofia no futebol. 

Foram, no total, 33 temporadas na carreira de treinador, onde comandou 16 clube, todos portugueses, pois nunca quis trabalhar no estrangeiro: Maia, Gil Vicente, Vitória SC, Académica, União de Leiria, SC Braga, Belenenses, Rio Ave, Moreirense, Leixões, Trofense, Arouca, União da Madeira e Chaves, para além do Paços de Ferreira.

Nestas 33 temporadas, o técnico acumulou 17 participações na Primeira Liga, mas, para chegar ao estatuto de lenda do segundo escalão o técnico precisou de disputar essa prova muitas vezes também. Foram 19 participações, nem todas completas, onde Vítor Oliveira garantiu umas impressionantes 11 subidas de divisão.

A trajetória dizia-se ascendente, para alguém que tanto subia, mas o treinador de uma maneira ou outra acabava sempre por «descer» ao segundo escalão, não pela via da despromoção, mas sim por ser uma arma muito cobiçada para os clubes mais ambiciosos da segunda liga.

Depois dessa primeira subida com o Paços de Ferreira o técnico teve de esperar seis anos para voltar a celebrar, mas, quando o fez, não parou de sorrir durante três temporadas. Em 1996/97 garantiu a subida ao comando da Académica. No ano seguinte comandou o União de Leiria e repetiu o feito da capital do móvel, subindo com a festa do título. Em 1998/99 pegou na equipa do Belenenses e colocou-a também na primeira divisão. Estava a reputação já mais do que criada: Vítor Oliveira era o rei das subidas. 

Foi em 2006 que regressou a Matosinhos, pela primeira vez como treinador. Assumiu o comando do Leixões a meio da temporada de 2005/06, mas seria no ano seguinte que se voltaria a sagrar campeão da Segunda Liga, dessa vez com o clube da sua cidade e com o qual deu os primeiros passos no futebol.

Em 2015, no União da Madeira @União da Madeira
A década seguinte seria mais uma de várias conquistas, com Vítor Oliveira a dar nova vida ao título de «rei das subidas», uma vez que nesse período voltou a conquistar o feito umas surpreendentes seis vezes. Foram cinco subidas consecutivas, entre 2013 e 2017, com o Arouca, Moreirense, União da Madeira, Chaves e um regresso ao Portimonense. Dois anos depois, em 2018/19, completaria o feito pela última vez, naquela que foi a última tentativa, com o Paços de Ferreira. Neste período levantou o troféu de campeão em mais três ocasiões, com o Moreirense, Portimonense e Paços de Ferreira. 

Sem «medo das palavras»

Não era só os inacreditáveis feitos na segunda liga que caracterizavam Vítor Oliveira durante a sua longa carreira, mas também a sua sempre presente humildade e a maneira como falava, semana após semana. 

Vítor Oliveira em 2019 @Vítor Parente / Kapta+

Não existia, na sua maneira de ser, críticas que não fossem seguidas de alternativas e soluções para os problemas que ele próprio levantava. Tanto com a sua equipa, o adversário, ou até a equipa de arbitragem. Tudo o que o treinador dizia publicamente era concreto e honesto, sem utilizar frases feitas palavras desnecessárias, e mesmo assim nunca era controverso. 

Pelo contrário, para um treinador que não primava pela eloquência ou o vocabulário de um académico, Vítor Oliveira sabia sempre o que dizer e quando o dizer, acumulando ao longo dos anos várias frases icónicas, que se tornaram um símbolo da sua maneira de ser.

Em 2018 precisou apenas de um minuto e meio para, numa conferência de imprensa ao serviço do Portimonense, dar, seguido de um «é muito simples», alternativas para processos que tornassem a liga e o futebol português mais competitivo, através do crescimento das equipas mais pequenas e a sua aproximação das maiores:

Acumulou, ao longo dos anos, inúmeras frases e discursos que não passaram indiferentes ao futebol português. Da boca de alguém que sabia que «não podemos ter medo das palavras», saíram ideias que valem a pena recordar, como foi o seu comentário acerca do campeonato português que, embora competitivo, pecava pela falta de qualidade:

«Este campeonato é competitivo e equilibrado, mas nivelado por baixo. Neste momento, não temos grandes equipas no futebol português», disse, apontando para as equipas pequenas que dispõem de recursos muito inferiores e também para as grandes, que fora de Portugal não são as mais fortes.

A sua visão sobre o porquê de preferir trabalhar na segunda divisão, que se deve também ao gosto por jogar para ganhar em oposição a lutar pela permanência, ficou também explicada da forma mais simples possível: «Jogar para não perder é um tormento, e põe as pessoas velhas. Não quero ficar velho tão depressa».

No último clube que serviu, o Gil Vicente, ainda disse coisas como «jogar para subir é muito menos assustador do que jogar para não descer» (encontrava-se, nessa altura, na primeira liga) e «não temos o perfume de outras equipas, mas temos um cheiro a suor que também é muito importante», referindo-se ao caráter e entrega da sua equipa. Mas também muitas outras:

Recorde algumas das frases do técnico

A última subida

@Catarina Morais / Kapta +
Em 2020, depois de uma época impressionante em que conseguiu o 10º lugar com um Gil Vicente que subira diretamente do Campeonato de Portugal, com uma equipa criada de raiz, Vítor Oliveira decidiu afastar-se temporariamente do comando técnico de equipas. 

Deixou o futuro em aberto, na sua última conferência de imprensa, garantindo que, «no futebol, seria de certeza», mas o seguir-se-ia então um ano sabático.

«Depois de uma vida tão ativa, agitada, parar de repente é até era capaz de me fazer mal. Pior do que andar nisto. Diminuir a carga e intensidade, sim, mas abandonar o futebol não», disse à Tribuna Expresso

Rejeitou convites para treinar outros emblemas de maneira a tirar um ano do futebol, de onde acabou por não conseguir afastar-se totalmente, tornando-se presença regular na televisão em comentários de jogos de futebol.

Era ativo e saudável, foi por isso tomado com muita surpresa quando em novembro desse ano foi anunciada a sua morte, após uma caminhada matinal na sua cidade de Matosinhos. Aos 67 anos, Vítor Oliveira sofreu uma paragem cardiorrespiratória e colocou o país inteiro de luto, naquela que foi a sua última subida. 

Será sempre um nome recordado, através dos prémios da Liga @Liga Portugal

Foi alvo de homenagens por cada um dos clubes onde trabalhou, tanto nas redes sociais como nos jogos que se seguiram, como um símbolo do impacto que teve em todo o lado por onde passou. Para a posterioridade, e como objeto do seu legado no futebol português, o nome de Vítor Oliveira ficou para sempre imortalizado nos prémios mensais e anuais para os treinadores da Liga Portugal

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Comentários

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PE
Campeão
2020-12-04 23h14m por Pedagogo
Obrigado por tudo grande campeão.
Vitor Oliveira
2020-12-04 12h38m por ProvedorZero
Nao treinou nenhum dos 3 eucaliptos mas treinou com sucesso o gigante Belenenses! RIP VO
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